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Espaço compasso #2


Guest Post com: Miguel Cruz

Cá dentro:

O mês que passou foi Outubro, mas vou falar-vos do Janeiro.
Conheci o seu trabalho na plataforma Tradiio. Começo por explicar o valor desta plataforma. É uma plataforma que tem como objectivo quebrar o paradigma implementado na era do streaming: para viver da música é preciso ter milhares de visualizações, para ter milhares de visualizações é preciso ser conhecido, para ser conhecido é preciso sabe-se lá o quê, e assim por diante até ao desespero.
Normalmente, o que acontece quando um artista que não é conhecido lança algo nas plataformas online (YouTube, Spotify, iTunes, etc.), é que angaria visualizações ou plays, mas não chega a números que lhe valham dinheiro. No Spotify cada play vale cerca de 0,006€ (menos do que um cêntimo) e se um artista chegar aos 10.000 plays, que é um valor que já considero bastante generoso, acumula apenas 60€, aproximadamente. 60€ é mais ou menos o valor de 6 cópias de um álbum, sendo que antigamente 10.000 plays significavam a venda de muitos mais cópias de um álbum. No YouTube nem se recebe dinheiro até um certo valor de visualizações. Além disso, fez com que as pessoas comprassem ainda menos cópias de álbuns do que quando surgiu a era da pirataria.

Resumidamente, é um pouco ingrato ser um modesto músico nos dias que correm. Como é que o Tradiio quebra este ciclo? É simples. Cada artista, por menos conhecido que seja, tem sempre o seu pequeno público (nem que seja apenas o pai e a mãe). Em vez do seu público o apoiar apenas com palavras bonitas ou visualizações/plays desprovidos de valor financeiro (no entanto, repletos de valor estimativo, note-se), apoia com uma quota simbólica mensal que permite ao artista utilizar esse dinheiro para fazer mais música, com cada vez mais recursos e, consequentemente, mais qualidade.

Ora, voltando ao Janeiro. Deparei-me pela primeira vez com o seu trabalho aquando do lançamento do seu primeiro EP homónimo, com a canção As Duas Que És, que denota desde logo o seu estilo único e peculiar, no melhor sentido da palavra. De repente, dois anos passados, surge cheio de estilo:
- Lançou uma nova canção intitulada de Canção Para Ti, que mistura o seu estilo acústico jazzístico (aquele toque que têm todos os artistas que põem um pé no Hotclube) com um pequeno arranjo electrónico já bem explorado no seu EP anterior. Uma canção alegre com uma estrutura típica, mas com uma sonoridade atípica que faz com que haja logo um interesse especial.



- Começou a lançar uma série no YouTube à qual deu o nome de janeirosessions!, na qual convida vários artistas já de renome no panorama musical português para tocar consigo duas canções. A primeira contou com o Miguel Araújo e a segunda com Salvador Sobral, que é a que partilho aqui:




- Foi anunciado como um dos compositores do Festival da Canção 2018, o que faz com que, após tanta coisa bonita, só seja possível esperar algo de muito bom.

É por estas e por outras que Janeiro é um artista que traz uma nova frescura a este Outono cheio de Verão e outra alegria a um mês tão triste e negro para o nosso Portugal.

E é aqui que entra a minha nova canção, intitulada de Menos Cor: uma homenagem a todas as vítimas dos incêndios dos dias 15 e 16 de Outubro. É um simples poema que reflecte sobre toda a perda que houve (vidas de pessoas e animais, casas, paisagens, oxigénio) e que é esquecida ao fim de algum tempo, tal como todas as aldeias o são, tal como todas as pessoas que lá vivem o são. Nasceu juntamente com a necessidade de ajudar, nem que fosse uma pessoa ou um animal. E foi mais do que isso que aconteceu. Menos Cor é uma mensagem para ficar e crescer saudável, é um carinho que é tão preciso nos olhares que encontrei. O seu significado não pode fugir juntamente com a memória de quem ficou.



Com uma mensagem próxima à anterior, fica aqui o novo vídeo realizado pelo André Tentúgal e pelo próprio Noiserv para a sua canção DEZOITO, presente no seu último álbum “00:00:00:00”. Noiserv é um autêntico criativo, sempre com algo novo e inovador quando apresenta o que quer que seja (um álbum, uma caixinha de música, uma cassete, um concerto, etc.) e isso torna-se um problema monetário para alguém que, como eu, colecciona discos. Este vídeo, na minha modesta interpretação, mostra imagens do interior de um edifício em ruínas e mistura-as com imagens de cidades, pessoas e carros em movimento, criando um perfeito contraste entre o abandono e o movimento. Estas imagens de movimento remetem para uma lembrança, dando a ideia de algo que existia e que já não existe. Isto pode simbolizar muitos dos acontecimentos que tem havido no mundo nestes últimos tempos.



Deixo também uma pequena nota extra para canções que foram lançadas neste mês e que valem a pena ouvir:
- Lembram-se da MONDAY do Espaço Compasso #1? Ora, a sua irmã, com quem forma a banda Golden Slumbers, lançou uma nova canção com a sua outra banda Vaarwell, de nome I Never Leave, I Never Go;
- Time for T. é a banda do Tiago Saga e lançou Mary, single que promove o seu novo álbum Hoping Something Anything lançado em Setembro.
- Ana Bacalhau voltou a aparecer em nome próprio com a canção Leve Como Uma Pena, escrita e composta pelo fabuloso Jorge Cruz, vocalista dos diabo na Cruz.

Lá fora:

A vivacidade do panorama musical lá fora é sempre muito intensa, daí eu ter bastante dificuldade em seleccionar algumas canções de tudo o que é lançado.
Ólafur Arnalds é um génio musical. Começo assim de repente, da mesma forma que ele apareceu de repente com este vídeo perfeito:



Porque a vida é assim, um conjunto de histórias que se cruzam, que se destroem, que se completam. Uma viagem vertiginosa pelo carril do tempo, com subidas e descidas, voos e quedas, mas sem nunca parar. Há aqui a representação de uma família e da sua evolução. A sua união, a sua passagem por momentos felizes, a sua passagem por momentos difíceis e de luto e a sua superação. Uma canção e um vídeo que me comoveram de verdade e que guardarei sempre para os meus momentos de reflexão.

Conheci o Glen Hansard no filme Once, um filme que adorei e com uma banda sonora espectacular. Desde aí que acompanho o seu trabalho cheio de canções que roçam o folk, mas que têm sonoridades muito próprias e um carácter emotivo extraordinário que é salientado pela sua poderosa voz, quando testa os seus limites nos picos emotivos das canções. A sua nova canção Time Will Be The Healer não é excepção. Uma letra sobre um amor não retribuído e sobre o poder do tempo, personificando-o como um salvador para o qual esse amor deverá ser direccionado.



Num registo mais de rock electrónico, temos o Nick Murphy, antes conhecido por Chet Faker, que lançou uma fantástica produção intitulada de Medication. Como Chet Faker, sempre esteve num limbo perfeito entre a música electrónica, o R&B/soul e o rock. Agora, em nome próprio, vinca ainda mais essa união, com canções mais elaboradas a nível de instrumental e com a voz mais escondida. A Medication eleva Nick Murphy a um novo nível que antes não era conhecido em si. Uma nova sonoridade cheia de intensidade, focando mais no rock electrónico e fugindo um pouco ao R&B/soul.



Podia continuar por aí fora, com tantos outros lançamentos de qualidade que houve neste mês, mas não me quero estender demasiado. Assim, deixo o resto para a playlist do Spotify deste mês.

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